segunda-feira, 22 de novembro de 2021

Olhares

 O louva-a-deus e o gato Mio!

O sol da manhã de Outono brilhava e apetecia mesmo passear um bocadinho no quintal da mana mais velha. Lá fui olhando bem para onde ponho os pés que isto de andar a olhar para o ar já não vai sendo muito seguro para a minha idade! 

E foi assim que descobri o louva-a-deus fêmea, imóvel, aquecendo-se ao sol.



Olhei-o de um lado, olhei-o do outro lado e juro que o insecto virou a cabeça e também me olhou. 

Esteve imóvel algum tempo. Depois com um andar lento e hesitante  começou a mover-se na direcção do canteiro cheio de plantas verdes. 

Entretanto apareceu o Mio. Gato curioso e disposto a caçar o louva-a-deus que tentava a  custo subir o pequeno muro do canteiro. O louva-a-deus parecia olhar para mim a pedir ajuda! Ou seria uma posição de ataque?

Tive que afastar o Mio e pegar num pauzinho para ajudar o louva-a-deus a subir e por-se a salvo das garras e dentes do gato.  O Mio bem espreitava para o meio da erva-príncipe mas o louva -a- deus estava já bem camuflado.


Eu sei bem que estás aí!

Não sei se fiz bem em intervir na ordem natural das coisas...
Tenho a certeza que o louva-a-deus fêmea não vai ter contemplações quando encontrar o louva-a-deus macho ... 
Mas isso é lá com eles!

Mena



quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Escola Primária

 Outros tempos...

Recentemente visitámos um museu, na Vidigueira, onde está recriada uma sala de aula da Escola Primária de há mais de um  século e que cuja composição e mobiliário se mantiveram quase inalterados até há pouco mais de três dezenas de anos.

Quando frequentei a Escola Primária, há bem mais de meio século, a sala de aula era muito semelhante.

E avivaram-se as memórias da minha passagem pela Escola Primária.

Lá estavam as carteiras duplas, o tinteiro para molhar a caneta de aparo  (e já na quarta classe, para encher a caneta de tinta permanente), o papel mata-borrão para secar a tinta em excesso do ditado ou cópia feita no caderno de duas linhas
Só a partir da 2ª classe é que tínhamos direito a usar caneta de aparo!
Antes disso, aprendíamos a desenhar as letras na ardósia, com o lápis de pedra e depois quase no fim da primeira classe passávamos para o caderno e lápis.

O uso da ardósia era um problema, pois as letras desenhadas  com tanto cuidado no trabalho de casa, várias vezes, desapareceram misteriosamente durante a noite. Da ardósia escorriam gotas que água (resultado da condensação do vapor de água dentro da mala) que não eram nada comparadas com as lágrimas que chorava ao pensar no que me iria acontecer ao chegar à escola, pois a professora não era para graças e eu ainda não tinha experimentado o peso da régua que já vira descer nas mãos de muitas companheiras... Salvou-me a minha querida mãe que secava muito bem a ardósia e me ajudava a refazer o trabalho. 

Agora recordo outro desastre mas este foi na pintura. No caderno de desenho tínhamos que fazer um desenho sobre a Primavera e eu desenhei as árvores cheias de folhas, flores, aves e duas ou três nuvens no céu. Na hora de pintar entrou em acção a minha preciosa meia dúzia de lápis de cor mas com a luz do candeeiro a petróleo, o azul e o verde foram trocados.

Quando mostrei o desenho à professora, à luz do dia, as folhas das árvores eram azuis e o céu estava pintado de verde. Fiquei tão assustada mas nesse dia só me calhou um ralhete. O que me salvou foram as flores e as aves cheias de cores! 

Depois, um dia, tive a sorte de ter uma caixa com dúzia de lápis de cor (um luxo) de prenda do Menino Jesus que não havia cá Pai Natal. Não poupei os lápis nas pinturas, fazendo trabalhar bem o apara-lápis, para estarem sempre afiados!

A régua de que me lembro era bem mais pequena do que a desta fotografia.
As reguadas estavam guardadas para quem errava as contas, os problemas ou dava mais de quatro erros e  três quartos no ditado... 

O mais perto que estive de levar uma reguada foi por causa dos Mandamentos da Santa Madre Igreja! 

Estava na quarta classe. Tínhamos aula de religião uma vez por semana e os mandamentos e orações tinham que estar na ponta da língua. Tão bem decorados como a tabuada, as preposições, advérbios (de modo, de tempo, de lugar), a conjugação os verbos, as linhas férreas, medidas de capacidade, de peso, de volume...

Ficou-me quase tudo arquivado na memória e ainda hoje sei de cor, muito do que aprendi e só mais tarde percebi para que servia (ou não).

Mas voltemos aos mandamentos! O sr. Padre naquele dia perguntou os mandamentos todos e várias orações. Houve muito engasgamento e falhas de memória. A mim calharam-me os Mandamentos da Santa Madre Igreja! 

Creio que são cinco e eu acertei quatro e meio! 

Depois do sr. Padre sair, a professora deu uma reguada por cada mandamento em falta ou oração não decorada e quando chegou à minha vez, disse-me "ficas para a próxima, já tens metade guardada"! 

Se há Deus, Ele que  lhe perdoe que eu não esqueço tanta reguada! Mas saliento que o sr. Padre não teve culpa nenhuma do castigo e até era boa pessoa.

Eu tinha sorte em ser boa aluna mas doíam-me as reguadas que outras meninas levavam e, sempre que podia, deixava copiar os problemas e as contas e a professora nunca me apanhou !!!!!!!!!!   Durante os períodos de cópia ou de resolução de problemas havia alguma acalmia na vigilância e a professora  sentava-se e fazia crochet ou renda. Não me lembro bem mas pareciam-me meias feitas com várias agulhas! E naquela meia hora de silêncio e paz, eu arranjava sempre uma maneira de passar  escritinhos para a colega da carteira de trás ou  do lado...

As competências treinadas  na escola desse tempo eram a leitura, a escrita e o cálculo. Era assim! Teve aspectos negativos e outros positivos...

Com seis anos, na primeira classe, em três meses aprendi a ler correctamente e depois do Natal  passei para a segunda parte do livro de leitura onde havia textos completos. Nessa altura, todos  os dias fazia uma cópia geralmente em casa, lia  a lição em voz alta,  ao pé da professora e mais tarde ( já na 2ª classe) fazíamos um ditado da lição estudada. Fazíamos redacções sobre temas variados mas não gostava muito da parte da ilustração, pois não era (sou)  muito prendada para o  desenho... Gostava mesmo era de ler e de resolver problemas daqueles complicados que já metiam áreas, perímetros ou volumes! E de ir ao mapar viajar, de Faro a  Miranda do Douro, pelas linhas férreas e ramais que hoje já não existem....

A capacidade de memorizar era largamente favorecida. Já a compreensão do que aprendíamos e a aplicação dos conhecimentos não era muito valorizado e no fundo acabava por depender de cada um de nós. Mas que a minha  memória ficou bem desenvolvida e fornecida de dados, isso ficou!

Os intervalos eram tão bons! Cheios de jogos, canções e explorações no terreno da escola cheio de amoreiras e flores silvestres! Lembro-me tão bem! 

As folhas de amoreira eram colhidas para alimentar os bichos-da -seda que eram preciosamente guardados numa caixa de sapatos. E ali víamos, sem saber, acontecer o milagre da metamorfose...

A nossa memória é mesmo uma máquina de viajar no tempo!

Soube há pouco tempo que a minha antiga  escola primária , há muito desactivada, vai dar lugar a uma casa mortuária com duas capelas. Uma em cada sala de aula.
Depois das vozes e dos risos das crianças vamos ter o choro dos vivos e o silêncio dos mortos! 
Tudo se transforma mas as amoreiras, por enquanto, ainda lá estão!